No ocidente, o nome Hatha-Yoga foi popularizado para indicar um simples conjunto de práticas físicas (especialmente as posturas, ou asanas, e as técnicas de respiração, ou pranayama). Porém, originalmente, Hatha-Yoga era um sistema de transformação espiritual, dentro da linha tântrica. Seu objetivo não era o bem-estar físico, nem a obtenção de saúde, e sim preparar, através de um conjunto muito complexo de práticas, para a obtenção de uma transformação total física e psíquica, encaminhando a pessoa para o Raja-Yoga (ou “yoga real”), que levaria a pessoa a ultrapassar os limites humanos comuns.
Segundo o dicionário de Monier-Williams, a palavra sânscrita Hatha significa violência, força, persistência – aquilo que força ou leva inevitavelmente a um resultado. Vem do verbo “hath”, que significa tratar com violência ou oprimir. Há também interpretações simbólicas da palavras, como a que considera que Ha+Tha significa a união entre o Sol e a Lua, mas a interpretação literal da palavra indica muito bem aquilo que caracteriza essa tradição do Yoga: um enorme esforço – incluindo esforço físico – para obter uma transformação completa do praticante.
As três obras mais antigas e respeitadas da tradição Hatha-Yoga que foram conservadas até hoje são: “Hatha-Yoga Pradipika”, “Gheranda Samhita” e “Shiva Samhita”. Não são textos muito antigos – é difícil datá-los, mas supõe-se que foram escritos entre os séculos XIV e XVIII de nossa era. Acredita-se que esses três textos surgiram dentro de uma tradição que floresceu na Índia a partir do século XII. Dessas três obras, considera-se que o “Hatha-Yoga Pradipika” (a “pequena lâmpada do yoga”), atribuído ao yogi Svatmarama, é o mais completo, mas os outros dois são também de grande importância.
No sistema Hatha-Yoga, os principais tipos de práticas são: purificação física (shatkarma), posturas (asana), controle da respiração ou da energia vital – prana (pranayama), contrações musculares ou “amarras” (bandha), gestos (mudra), inversão dos sentidos (pratyahara), meditação (dhyana), união (samadhi). Ao contrário do sistema de Yoga de Patañjali, exposto nos “Yoga Sutras”, o Hatha-Yoga praticamente não dá importância à parte ética do Yoga (yama, niyama) e dá uma ênfase muito grande às práticas físicas. A teoria do Hatha-Yoga (e de toda a linha espiritual tântrica) descreve uma estrutura sutil do corpo humano, constituída por canais (nadi) e por centros de energia (chakras) que são percorridos pelos vários tipos de energia vital (prana). O desenvolvimento espiritual ocorre com o despertar da energia sagrada (shakti) que fica normalmente adormecida no chakra inferior – muladhara – parecendo com uma serpente enrolada (kundalini), que sobe pelas principais nadis atravessando os diversos chakras.
Ao contrário do que costuma ser ensinado nas academias ocidentais de Hatha-Yoga, algumas das técnicas apresentadas pelos textos tradicionais indianos são bastante perigosas, podendo desencadear dentro da pessoa certos processos físicos e espirituais sobre os quais conhecemos pouco. Na tradição indiana do Hatha-Yoga, esses exercícios eram feitos necessariamente sob a supervisão de um mestre ou guru, em condições especiais de vida (incluindo alimentação especial, um local especial de práticas, e o isolamento total da vida social). Tentar praticar alguns dos exercícios mais fortes do Hatha-Yoga antigo, sem uma preparação e um acompanhamento adequados, pode levar a muitos problemas. Assim, os textos sobre os quais estamos comentando aqui não devem ser utilizados como se fossem manuais de exercícios curiosos com os quais poderíamos brincar sem problemas.
Dos três textos “clássicos” acima referidos, existem atualmente traduções completas para o português de dois deles, e uma tradução incompleta do terceiro.
· Hatha Yoga Pradipika, por Pedro Kupfer
· Gheranda Samhita, por Gustavo Cunha
· Shiva Samhita, por Pedro Kupfer
Todas estão disponíveis na biblioteca de textos do site Shri Yoga Devi:
http://www.yogadevi.org/textos.html
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